sábado, outubro 16, 2004

HUMILHAÇÃO - Paciência ! Chega !!!

SHAAREI TIKVASCO


Após a bem-sucedida XXXXXXª tentativa de entrarmos para um serviço na Grande e Renovada Sinagoga de Lisboa, conseguimo-lo, para nossa grande alegria, em Simchat Torah, alegria esta que se repetiu no dia a seguir, tendo sido gentilmente recebidos para o serviço de Kabbalat Shabbat.

Eu, que já tinha prometido a mim próprio, com toda a solenidade e veemência, nunca mais expor-me ao ridículo de situações abusivas, anti-éticas e anti-constitucionais, descobri que, afinal, valia a pena tentar e ter um bocadinho de boa vontade e savlanut. Sobretudo, quando nos é pedido por alguém tão especial e importante para nós que lhe demos um voto de confiança. E assim foi.

Parecia que estava tudo a mudar. Não foram só as paredes que foram pintadas, o portão trocado por outro mais bonito, com grandes e convidativos caracteres hebraicos, as escadas envernizadas, o stock de siddurim e chumashim renovado. Bem, afinal, parecia que tinham razão e, finalmente, nascera uma nova Sinagoga em Lisboa.

Com esta esperança andei duas semanas, fazendo planos, sonhando, esperando...enfim, “tikvando” na minha inocência de “yehugoy”, de judeu pleno e consciente mas de estatuto inferior, dependente de um pedaço de papel para ser contado para minyan, um “sub-alguém” que, durante duas semanas, já parecia ver a luz ao fundo do túnel e os shearim da esperança finalmente a quererem abrir-se a nós, os “pobres marraninhos”, os jacobinos da Ohel destroçada e em ruínas.

Parecia, afinal, que as lágrimas que tantas vezes já me caíram pelas faces tinham mudado de direcção e alcançado o Céu; parecia que as horas passadas a estudar as rezas para conseguir acompanhar um serviço tinham sido compensadas, parecia que a minha vontade em cumprir a(lguma)s mitzvot, guardar o Shabbat e manter-me, se não rigorosamente kasher, pelo menos parve, além da alegria inefável que tudo isto proporciona a um aspirante a carteirizado-judeu, tinha surtido efeito.’ “Ena pá!” Até que enfim, parece que há milagres!’ Dizia eu a alguém, esquecendo-me dos meus quase 40 anos e utilizando um calão de adolescente inconsequente, iludido, cego para a realidade dura das relações humanas, do poder de uns poucos contra a suposta pequenez de alguns que mendigam não um pedaço de pão, nem uma moedinha, mas apenas e simplesmente uma oportunidade: “Por favor, tenham piedade, deixem-me entrar para rezar e eu prometo que serei bonzinho! CHEGA!“

Já ouvi muitas vezes dizerem-me que há, na CIL, pessoas que nos querem lá dentro, que gostam de nós, etc. Há? Então, onde estão? Depois de ter sido humilhado à entrada da Sinagoga de Lisboa, como nunca fora até então (e acreditem, foi pior do que no Espaço Chiado, pois EU SEI o que senti ontem), em que tive de ficar de mãos ao ar como se fosse um ganav qualquer apanhado em flagrante delito, a ser literalmente VASCulhado, a ter de ouvir perguntarem-me se trazia alguma faca escondida, ou pistola, ou algo que pudesse pôr em causa a segurança da Comunidade.

Agora sou eu que vos peço: PACIÊNCIA!!!!! CHEGA!

Chega de estudar horas e noites seguidas para poder ser um bom judeu, aprender que há que ter ética, não fazer aos outros aquilo que não queremos que nos façam a nós, e, no fim, ter de passar por isto tudo outra vez.

CHEGA!

Agora sou eu que vos imploro paciência, dêem-me alguma, pois a minha já se esgotou! Onde estão, então, as pessoas que nos querem? Não há ninguém na CIL? Hello! Anybody home? Não há quem nada possa fazer? Ou serão exactamente esses que assistem a humilhações públicas passivamente sem nada fazerem? E, pior ainda, dão PODER A UM PUTO para determinar quem entra ou não? A insinuar que alguém, quem quer que ela, ou ele, seja, possa representar um perigo para a Comunidade? A obrigar(em-me) a entrar na sinagoga numa noite chuvosa e fria sem casaco, por poder vir a representar uma ameaça à Comunidade? Porquê tanto poder? Porquê tão pouca ética? Porquê tão pouco respeito? Porquê tão poucos valores? Porquê tão pouco amor? Porquê tanta humilhação? Porquê? Savlanut? Deixem-me rir. Mas enquanto eu me rio, por favor, FAÇAMOS ALGUMA COISA, que isto já é demais. Há que acabar essa guerra de sei-lá-quem contra sei-lá-quê! Das Portas da esperança... ops!! Disse esperança? esperança de quê? De ficar à espera no passeio público? De alguma dia, alguma hora, alguma vez poder ser tratado com o mínimo de dignidade? Esperança de vir a ser judeu? Eu não preciso ‘dessa’ esperança, pois eu sei aquilo que sou.

E se há nomes impróprios para uma casa de oração, outros há que dizem bem aquilo que representam: ‘Ohel Yaakov’, a Tenda de Yaakov. Sim, Yaakov, o medroso, o tímido, o pequeno, o inactivo, o mole, o ‘banana’, o que foi enganado e se deixou enganar, mas que descobriu um dia que é preciso lutar, e que lutou, e lutou contra D’us e venceu, e recebeu um novo nome, ISRAEL. Sim, somos pequenos, somos nada, pois não temos carteirinha e, por isso, abusam de nós, mas SOMOS ISRAEL! A 100%! Digam o que disserem. Pensem o que quiserem. E se isso não conta para alguns, ou mesmo para a maioria, conta para Aquele que não apenas soprou para dentro de nós o sopro da vida, mas que nos deu uma neshamá que brada aos Céus como a alma de Hevel! Pois, cada vez que tais humilhações acontecem, somos apunhalados um pouquinho pelos nossos irmãos. Mas, tal como Hevel, estamos à espera de justiça, e de que a tão falada Ética do Judaísmo não sejam só palavras de um livro sagrado, mas uma prática comum e visível do povo que foi chamado por Yeshayahu “OR LAGOYIM” (Luz para as nações); a luz brilha, a luz ilumina, a luz eleva, a luz esclarece; a luz não apaga, a luz não entorpece, a luz não humilha, a luz não deixa ter dúvida. Mas, se não há dúvidas, então, pergunto-vos: Até quando ter savlanut?

Entretanto, vou deixar-me apunhalar mais vezes. Talvez até que morra o meu orgulho (ou a minha vergonha). Deixar-me-ei apunhalar na próxima sexta-feira, e na outra, e na que virá a seguir...Porque a minha paciência acabou, mas o meu amor por haShem e pelo Seu povo, não. Que um dia, mas em breve, possamos cantar ‘Hinei Mah Tov’ sem gaguejar, nem desviar os olhos para o chão por não sentirmos aquilo que estamos a cantar. Porque, de facto, sabemos o que significa ética. Porque, de facto, sabemos ser judeus.

Kol tuv!
José Costa

8 Comments:

At 10/16/2004 6:45 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ó meu querido, nem quero acreditar, tenho tanta pena que tenham voltado a fazer o mesmo, não pode ser, não pode continuar a ser assim, ninguém merece - e tu ainda menos - ser tratado assim, um local de culto NÃO é uma casa particular. Um beijo grande, Paula João

 
At 10/17/2004 7:12 da tarde, Anonymous Anónimo said...

... e o que é importante é termos orado com os nossos «primos»!
Participámos!!!
" ..é mais dificil gerir o silêncio que as palavras. ".
Não se deve dar tanta importância a quem não a têm...
A nossa resposta deve ser: perseverança!

Calma «primo» Costa...

Shalom

Abílio

 
At 10/17/2004 7:13 da tarde, Anonymous Anónimo said...

... e o que é importante é termos orado com os nossos «primos»!
Participámos!!!
" ..é mais dificil gerir o silêncio que as palavras. ".
Não se deve dar tanta importância a quem não a têm...
A nossa resposta deve ser: perseverança!

Calma «primo» Costa...

Shalom

Abílio

 
At 10/17/2004 9:31 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O que me custa não é dar importância a quem DE TODO não a tem, mas ver que quem tem REALMENTE PODER NADA FAZ!
Obrigado pelo apoio. Admiro a tua atitude, apesar de teres passado pelo mesmo, mas D-us fez-nos cada um diferente, e eu dijiro muito mal injustiças e humilhações.
Um grande abraço,
Costa

 
At 10/18/2004 10:17 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Mariana, obrigado pela mensagem. Penso que qualquer abanão seria positivo, desde que não cause mais problemas (se é que isto é possível). Disse-te, pessoalmente, que poderias fazer circular a minha mensagem na CIL, mas, talvez fosse melhor saber a opinião dos demais. Agradecia, portanto, que todos se pronunciassem a este respeito.
Shalom!
José Costa

 
At 11/15/2004 9:50 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Sra. D. Maria Pires
Apreciei o seu comentário, mas julgo que não utilizei palavras que pudessem chocar quem quer que fosse. Estando por fora da situação, ser-lhe-á fácil ter essa opinião. Penso que se equivoca quando diz que esta forma de expor as coisas não servem para abrir portas.
Kol tuv
José Costa

 
At 2/02/2005 5:47 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ao ler aquilo que o José escreveu, é como se estivesse, em parte, a falar de mim (e não só, de certeza).
Não presenciei aquilo que lhe aconteceu, nem tal era preciso para saber o que sentiu, pois eu próprio vivi uma situação idêntica. Pelos vistos causada pelo mesmo indivíduo.
Realmente é INDIGNO, INACEITÁVEL, e acima de tudo INJUSTO. Mas o pior é que TUDO isto se passa/passou com a TOTAL INDIFERENÇA do resto da CIL.
Num episódio idêntico passado comigo, à saída da Sinagoga, as pessoas saíam depois das orações, olhavam e viravam as costas. Algumas delas não eram elementos comuns da CIL, mas membros de topo.
A única pessoa que interveio foi a mesma que me tinha convidado a ir à Sinagoga - já várias vezes - e acabou por levar com a RAIVA do tal Vasco. Vários ficaram parados a assistir sem nada fazer, mas mais ninguém mexeu uma palha para parar aquele espectáculo.
Não sei quem disse que "A não cooperação com o mal é tão importante como a cooperação com o bem".
Havia muito mais a dizer, mas os pormenores são maus demais... Se as coisas continuarem como ultimamente, mais vale esquecer tudo. Só fará o alcançar do objectivo uma vitória ainda mais "saborosa".

Kol tuv e um abraço amigo,
Gabriel Canhoto

 
At 4/14/2008 7:46 da tarde, Blogger Robson Ben-Hur said...

Tenho aprendido muito sobre o Judaísmo por meio da Associação da Juventude Israelita Hevhver. Estou cursando pós-graduação em Educação das Relações Étnicos Raciais e Multiculturalismo na Unversidade do Planalto Catarinense. Na disciplina História e Cultura da África escrevi um artigo sobre os 'Judeus Etíopes ou Falashas', confesso que não encontrei melhor material para a minha pesquisa do que os blogs e sites judeus. Faz 12 anos que venho estudando sobre o Judaísmo, além dos livros que tenho lido tenho bebido da matriz judaica via internet. Vocês estão de parabéns. Todavia gostaria de deixar aqui uma proposição para o mundo judaico:
Atualmente vivo no grande dilema...pois sei da minha descendência até a quarta geração das famílias portuguesas sefaraditas do nordeste brasileiro que tiveram que se converterem ao cristianismo "cristãos-novos, batizados em pé, ou os marranos". Contudo, seu judaísmo foi perdidona história brasileira devido a imposição papal a estes sefaraditas. Minha familia é dos Borges, dos Castros, dos Ribeiros. No entanto, gostaria de me converter ou de retornar as minhas raízes judaicas, já que a minha família não pratica. Todavia, já tentei falar com rabinos, ou até mesmo entrar numa Sinagoga pra assistir a celebração, e jamais conseguir tal milagre. Não consigo entender isso, penso em desistir, pois na cidade em resido não conheço nenhum judeu, e quando vou a Curitiba ou São Paulo, telefono para as sinagogas e nenhuma me oferece este privilégio de entrar neste santuário sagrado. Gostaria que me enviassem a resposta!

 

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